quinta-feira, julho 27, 2006

Homem morreu sem nome (Parte III)

Amava tudo fervorosamente, para esquecer a carência das possíveis sete décadas que sentiu obrigação em viver. Queria morrer, desde o dia em que se apercebeu que existia, mas ensinaram-lhe que a vida devia ser cortejada com a mesma dedicação daqueles que se entregam voluntariamente à morte: com coragem! Setenta anos, sensivelmente, são o relato de uma heroicidade inqualificável, digno de figurar na história mundial daquela cidade. Mas não, vá lá alguém querer saber do homem que foi apelidado de Homem e que não queria morrer por morrer...

PH-Bar
- Ó meu, manda lá essa!- gritou Joaquim.
- Qual delas, a branca ou a preta?- retorquiu o barman, mais conhecido por Cupido.
- Claro que só pode ser branca, ó meu.
- Toma lá, e já te disse que não sou teu! A tua mulher é na segunda à direita... O meu nome não é assim tão difícil de pronunciar. S-e-r-a-f-i-m, Serafim. Ouviste bem? Serafim!
- CUPIDO! CUPIDO! CUPIDO!- explodiram todos em uníssono, com o intuito de apoquentar a paciência do homem mais querido das redondezas, o senhor Serafim.
A hora já ia longa e o bar tinha de fechar. As normas que protegiam o sossego da cidade falavam forte, mais forte que a vontade de fazer dinheiro e o prazer das canecas empilhadas. Um última passagem pelo WC, depois da golada final dos líquidos espirituosos, e direitinhos para os lençóis. Alguns ficavam a deambular pelos cantos da freguesia, em conversas desconexas para entreter a bebedeira. Eram os famosos PHilósofos, os habituais frequentadores do PH-Bar do senhor Serafim (Cupido, para os clientes).

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